As doenças auto-imunes (DAI) são um grupo de mais de 100 doenças relacionadas entre si, que envolvem qualquer órgão ou sistema do nosso organismo. Inclui doenças que atingem simultaneamente ou sequencialmente esses orgãos ou sistemas e outras dirigidas especificamente contra alguns deles, como sejam o sistema nervoso, os aparelhos digestivo e respiratório, pele, sangue, olhos, articulações e glândulas endócrinas, entre outros exemplos. O problema é o mesmo em todas as doenças auto-imunes : o sistema imunitário fica desorientado, atacando o próprio corpo e os órgãos que deveria proteger.
No seu conjunto, as DAI atingem três vezes mais mulheres que homens, podendo, em alguns casos, esta proporção ser mais elevada, como é o caso do lúpus em que as mulheres são afectadas nove vezes mais. As doenças auto-imunes são uma das 10 principais causas de morte nas mulheres com menos de 65 anos.
Os sintomas são variáveis de uma doença para outra e até dentro da mesma doença. Como são doenças que afectam vários órgãos, podem ter sintomas enganadores, o que dificulta o diagnóstico.
A mesma doença pode ter sintomas muito diferentes em várias pessoas e em várias idades.
As doenças auto-imunes são das doenças mais difíceis de reconhecer e de diagnosticar. Cada doença pode ter uma gravidade ligeira ou ser muito grave. Para que os doentes possam viver melhor e mais tempo é necessário um diagnóstico mais rápido para que o tratamento possa ser iniciado precocemente.
O QUE PROVOCA AS DOENÇAS AUTO-IMUNES?
Os cientistas não compreendem ainda totalmente o sistema imunitário e o que leva o nosso organismo a produzir um ataque contra si próprio.
Normalmente o sistema imunitário protege o nosso corpo dos microorganismos externos. Fá-lo produzindo anticorpos que são proteínas especiais que reconhecem e destroem os invasores.
As doenças auto-imunes ocorrem quando estes anticorpos atacam as células do próprio organismo, tecidos e órgãos. Sabemos que há alguns factores desencadeantes que podem ter importância no desenvolvimento de uma doença auto-imune: as bactérias, os vírus, as toxinas, as hormonas, o stress e alguns fármacos podem desencadear uma resposta auto-imune nalgumas pessoas que tenham uma predisposição hereditária (genética) para desenvolver uma DAI.
QUE TIPOS DE DOENÇAS AUTO-IMUNES EXISTEM?
Os processos auto-imunes podem afectar o organismo de diversas maneiras. A autoimunidade pode resultar na destruição lenta de tipos específicos de células, tecidos, órgãos ou articulações, na estimulação do crescimento de um órgão ou interferir na sua função. Os órgãos e tecidos frequentemente afectados incluem as glândulas endócrinas (tais como a tiróide, pâncreas e supra-renais), componentes do sangue (como os glóbulos vermelhos ou as plaquetas) e o tecido conjuntivo: pele, músculo e articulações.
As doenças auto-imunes são frequentemente classificadas como específicas de órgão e como não específicas de órgão.
Nas doenças auto-imunes específicas de órgão, o processo autoimune é dirigido contra um único órgão. São exemplos a tiroidite de Hashimoto (glândula tiróide), a anemia perniciosa (estômago), a doença de Addison (glândulas supra-renais) e a diabetes tipo 1 (pâncreas).
Nas doenças auto-imunes não específicas de órgão (ou sistémicas), a autoimunidade provoca lesões em vários órgãos ou tecidos.. São exemplos desta doenças sistémicas o Lúpus Eritematoso Sistémico (LES), a Artrite Reumatóide (AR) e o Sindroma de Sjögren (SS).
QUANDO PENSAR NUMA DOENÇA AUTO-IMUNE?
As Doenças Auto-imunes podem afectar qualquer órgão ou tecido do organismo, podem provocar qualquer sintoma e podem ser confundidas com qualquer outra doença: essa é uma das dificuldades que as doenças auto-imunes apresentam.
Uma doença auto-imune pode-se apresentar como uma febre prolongada (mais de 3 semanas), que não cede a antipiréticos ou antibióticos, por dores nas articulações com edema (inchaço) das articulações, por manchas vermelhas na face que aumentam com o sol, aftas que não passam, abortos espontâneos e de repetição, por uma pericardite ou pleurite, uma psicose, anemia, diminuição das plaquetas, olhos e boca seca, mãos que ficam brancas com o frio, diminuição da força ou sensilidade nas extremidades, insuficiência renal, mãos suadas e tremor, etc.. Estes sintomas e sinais podem apresentar-se duma forma lenta que leva o doente à consulta ou de uma forma aguda, que necessita de uma abordagem numa urgência.
Quando se está perante um quadro em que vários órgãos parecem estar doentes ao mesmo tempo, devemos suspeitar que se trata de uma Doença Auto-imune.
COMO SE FAZ O DIAGNÓSTICO?
Como se trata de doenças que podem ser confundidas com qualquer outra doença, é muitas vezes difícil chegar a um diagnóstico só com um exame. A grande arma para orientar os exames é a história clínica (escutar as queixas dos doentes) e perante os antecedentes do doente e da família escolher cuidadosamente os exames a realizar. A atitude de realizar rapidamente todos os exames não produz um diagnóstico mais rápido, pelo contrário. Deve ser o seu médico assistente a orientar a realização desses exames.
QUE TRATAMENTOS HÁ PARA AS DOENÇAS AUTO-IMUNES?
Corrigir as deficiências geradas no organismo é muito importante no tratamento das doenças auto-imunes. É o que fazemos ao tratar as tiroidites com suplementos de hormona tiroideia ou a diabetes tipo 1 com insulina. Nas doenças auto-imunes do sangue podem ser necessárias transfusões.
É igualmente importante reduzir a inflamação. Algumas doenças auto-imunes ligeiras podem ser tratadas com anti-inflamatórios não esteróides (AINE) para alívio de sintomas. Alguns AINE mais recentes, os coxibes (celecoxibe, etoricoxibe) inibem um enzima do organismo que provoca dor e inchaço e podem ser úteis em doenças mais graves.
Muitas vezes há que controlar a resposta imunológica excessiva. Os fármacos mais frequentemente usados são os corticosteróides. Algumas doenças podem ser tratadas com imunossupressores, fármacos que actuam sobre o sistema imune. Estes fármacos devem ser utilizados com precaução porque podem ter efeitos secundários, incluindo maior susceptibilidade a infecções, hipertensão arterial, cataratas, alterações do sono e osteoporose. Pode ser difícil controlar a doença e preservar a capacidade do organismo para resistir à doença.
As imunoglobulinas endovenosas (IVIG) são utilizadas no tratamento de várias doenças auto-imunes para reduzir a circulação de imunocomplexos, que são proteínas produzidas nestas doenças e que podem lesar alguns órgãos vitais como o rim ou o cérebro.
Alguns fármacos, chamados modificadores da doença, são utilizados em primeira linha na Artrite Reumatóide porque alteram a evolução da doença, além de aliviarem os sintomas, sendo o mais utilizado o metotrexato. Há uma nova classe de fármacos, chamados biológicos, que são baseados em componentes extraídos de células vivas e têm como alvo as células do sistema imunitário envolvidas nas doenças autoimunes. Os medicamentos biológicos são produzidos por biotecnologia em laboratórios especializados e têm demonstrado efeitos muito benéficos em alguns doentes com algumas destas doenças.
Todos os tratamentos devem ser discutidos individualmente com o seu médico assistente.
AS DOENÇAS AUTO-IMUNES PODEM SER HEREDITÁRIAS?
Cerca de 20% da população tem algum factor hereditário que aumenta a hipótese de ter uma doença auto-imune. No entanto, o facto de haver algum familiar directo com uma destas doenças não quer dizer que vá desenvolver a doença, mas apenas que pode ter um risco acrescido de a ter, como acontece de resto em relação a muitas outras doenças.
Quando se desenvolve uma doença auto-imune, a probabilidade de desenvolver outra está aumentada, todavia, a predisposição genética não é uma causa só por si. Parece que devem existir outros factores presentes para provocar a doença.
É importante que as famílias com Doença Auto-imune refiram este facto ao médico quando outro membro da família tem um problema de saúde de difícil esclarecimento.
A QUEM DEVE RECORRER?
Dado que a autoimunidade afecta vários órgãos, há várias especialidades médicas que tratam doenças auto-imunes, sobretudo quando há complicações.
Deve haver uma estreita ligação entre o médico de Medicina Geral e Familiar e os especialistas, sendo frequente haver necessidade de intervenção de outras especialidades, assim como a de outros técnicos como enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais e outros.
Os especialistas com mais experiência neste tipo de doenças são os internistas e os reumatologistas.
Os especialistas de Medicina Interna são os médicos do adulto que abordam e tratam os doentes como um todo, recorrendo aos especialistas de determinados órgãos, para a execução de técnicas ou para apoio no tratamento de doenças mais raras desses órgãos ou sistemas. Essa capacidade torna-os particularmente vocacionados para este tipo de patologias, sobretudo quando têm um carácter sistémico, ou seja, podem atingir vários órgãos sucessivamente ou ao mesmo tempo.
Na quase totalidade dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde no continente e ilhas os internistas criaram consultas especializadas para atenderem este tipo de doentes, chamadas Consultas de Doenças Auto-Imunes ou de Imunologia Clínica. A lista destas consultas nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde é apresentada em anexo, ou consulte www.nedai.org.
O QUE É O NEDAI?
O NEDAI é o Núcleo de Estudos das Doenças Auto-Imunes da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI), a única organização em Portugal que congrega mais de 200 médicos internistas dedicados ao tratamento de doenças auto-imunes.
Os principais objectivos do NEDAI são afirmar cada vez mais a responsabilidade e importância dos internistas no estudo e abordagem destes doentes e elevar permanentemente os padrões da qualidade assistencial neste sector da nossa actividade.
Nesse sentido o NEDAI promove reuniões científicas nacionais e internacionais, atribui anualmente uma Bolsa de Estudos em AutoImunidade, que tem como objectivo promover o conhecimento e a formação na área da Auto-Imunidade em serviços estrangeiros de prestígio.
Atribui, desde 2005, o Prémio NEDAI de Investigação em AutoImunidade, que tem como finalidade premiar trabalhos de investigação no âmbito das Doenças Auto-imunes. Além disso, edita folhetos para os doentes, assegura o seu sítio: NEDAI.org, amplamente visitado por profissionais e doentes, desenvolveu o Registo Informático de Doenças Auto-imunes (RIDAI), com o objectivo de informatizar progressivamente as consultas de Doenças Auto-imunes (DAI) e está a implementar o Registo Nacional das Doenças Auto-imunes da responsabilidade da Medicina Interna (RENDAI-MI).
O QUE POSSO FAZER?
As doenças auto-imunes não são contagiosas. São doenças crónicas, podem causar lesões graves de órgão e ameaçar a vida.
Os doentes, sobretudo as mulheres, com uma doença auto-imune têm sofrido falta de atenção e de investigação. Sabemos que as doenças auto-imunes, têm uma base genética e podem ter tendência familiar, uma doente com Lúpus, pode ter uma filha com diabetes tipo 1 e a mãe ter Artrite Reumatóide, por exemplo.
É preciso que as doenças auto-imunes sejam reconhecidas como um “tipo” de doença. Se o público em geral e os médicos de família estiverem mais informados, estas doenças serão diagnosticadas mais precocemente e melhor tratadas. As mulheres jovens, em especial, não são muitas vezes levadas a sério quando têm sintomas vagos e muitas vezes consultam médicos de várias especialidades.
Há necessidade de maior colaboração entre os doentes, a sociedade, os investigadores e os clínicos. A investigação pode ajudar-nos a tratar a causa das doenças auto-imunes em vez de tratar os seus sintomas ou complicações.
As consultas de doenças auto-imunes são feitas por médicos com experiência no diagnóstico e tratamento destas patologias e alguns são investigadores nesta área.
Caso o seu médico assistente lhe proponha participar nalgum estudo que esteja a decorrer, colabore! Estará a ajudar-se a si próprio e a outros.
Divulgue a consulta de doenças auto-imunes onde é seguido e ajude distribuindo informação disponível, nomeadamente folhetos. O nosso interesse é o doente, colabore connosco.
Alguém que você conhece tem uma doença auto-imune!
LISTAGEM DE DOENÇAS AUTO-IMUNES
- Alopecia Areata
- Anemia Aplástica
- Anemia Hemolítica Auto-imune
- Anemia Hemolítica Imune Induzida por Fármacos
- Angeíte Leucocitoclástica Cutânea
- Arterite de Células Gigantes
- Arterite de Takayasu
- Artrite Enteropática
- Artrite Idiopática Juvenil
- Artrite Psoriática
- Artrite Reactiva
- Artrite Reumatóide
- Ataxia Cerebelosa associada a Anticorpos Anti-Descarboxilase do Ácido Glutâmico
- Bronquiolite Obliterante Idiopática
- Cardiomiopatia Dilatada
- Cirrose Biliar Primária
- Colangite Esclerosante Primária
- Colite Ulcerativa
- Deficiência Adquirida do Factor X
- Degeneração Cerebelosa Paraneoplásica
- Dermatite Herpetiforme
- Dermatomiosite
- Diabetes Tipo I
- Doença Celíaca
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Protrombina
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor IX
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor V
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor VII
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor VIII
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor XI
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor XII
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Factor XIII
- Doença da Coagulação por Autoanticorpos anti-Fibrinogénio
- Doença de Addison Auto-imune
- Doença de Behçet
- Doença de Crohn
- Doença de Goodpasture
- Doença de Graves
- Doença de Kawasaki
- Doença de Lyme
- Doença do Ouvido Interno Imuno mediada
- Doença Linear a IgA
- Doença Mista do Tecido Conjuntivo
- Doença Ovárica Auto-imune
- Doenças Indiferenciadas do Tecido Conjuntivo
- Encefalite de Rasmussen
- Encefalite Límbica
- Encefalite Límbica Imuno-respondedora associada a Anticorpos anti-Canais de Potássio
- Encefalomielite Paraneoplásica
- Epidermólise Bolhosa Adquirida
- Esclerodermia
- Esclerose Múltipla
- Esclerose Sistémica
- Espondilite Anquilosante
- Febre Reumática
- Fibrose Pulmonar Idiopática
- Gastrite Auto-imune
- Glomerulonefrite Associada a ANCA
- Granulomatose de Wegener
- Hepatite Auto-imune Tipo 1
- Hepatite Auto-imune Tipo 2
- Hipofisite Auto-imune
- Líquen Plano Penfigóide
- Lupus Eritematoso Sistémico
- Miastenia Gravis
- Miocardite
- Neuromiotonia Adquirida
- Neuropatia Axonal Motora Aguda
- Neuropatia Axonal Sensitivo-Motora Aguda
- Neuropatia com Bloqueio da Condução Motora Aguda
- Neuropatia Sensitivo-Motora Adquirida Multifocal
- Neuropatia Sensitivo-Motora Desmielinizante Adquirida Multifocal
- Neuropatia Motora Multifocal com Bloqueio da Condução
- Neuropatia Panautonómica Aguda
- Neuropatia Periférica Desmielinizante Paraproteinémica
- Neuropatia Sensitiva Paraneoplásica
- Neuropatia Sensitiva Pura Aguda
- Neutropénia Auto-imune da Infância
- Neutropénia Auto-imune Primária do Adulto e Adolescente
- Neutropénias Auto-imune Secundária
- Orquite Auto-imune
- Pancreatite Auto-imune
- Pênfigo a IgA
- Pênfigo Cicatricial
- Pênfigo Foliáceo
- Pênfigo Gestacional
- Pênfigo Induzido por Fármacos
- Pênfigo Paraneoplásico
- Pênfigo Vulgar
- Pênfigóide Bolhoso
- Poliangeíte Microscópica
- Poliarterite Nodosa
- Polimiosite
- Poliradiculoneuropatia Desmielinizante Inflamatória Crónica
- Poliradiculopatia Desmielinizante Inflamatória Aguda
- Psoríase
- Púrpura de Henoch-Schönlein
- Púrpura Trombocitopénica Auto-imune
- Sindrome de Churg-Strauss
- Sindrome de Guillain-Barré
- Sindrome de Miller Fisher
- Sindrome de Morvan associado a Anticorpos anti-Canais de Potássio
- Síndrome de Sjögren
- Sindrome de Stiff-Person associada a Anticorpos antiDescarboxilase do Ácido Glutâmico
- Sindrome de Von Willebrand Adquirida
- Sindrome deCogan
- Síndrome do Anticorpo Antifosfolípido ou Sindrome de Hughes
- Sindrome Miasténico de Lambert-Eaton
- Sindrome Opsoclónico-mioclónico
- Sindrome Paraneoplásico de Stiff-Person
- Síndrome Poliglandular Auto-imune
- Síndrome SAPHO
- Tiroidite Auto-imune
- Urticária Crónica
- Uveíte Auto-imune
- Vasculite Crioglobulinémica Essencial
- Vasculite de Pequenos Vasos Pauci-imune
- Vítiligo
FONTE: http://www.nedai.org/
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